quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Gunther Von Hagens – Médico ou açougueiro?

Por Rafaela Santana

A primeira pergunta que nos vem em mente é: O que a morte tem a ver com a arte? A arte sempre foi utilizada para registrar a morte em toda a história da humanidade. Jesus Cristo foi pregado na cruz e se tornou o símbolo mais poderoso do cristianismo, porque ao mesmo tempo mostra o horror da morte e a esperança na salvação e vida eterna. Mas outras civilizações se utilizavam disso para aprisionar o coração e a mente do seu povo. Os egípcios usavam a arte na vida e na morte estampada nos túmulos e implantada em sua cultura. Os Astecas mostravam o sacrifício humano para se alcançar a vida eterna. Os Etruscos (aglomerado de povos que viveram na atual Itália) transmitiam mensagens de uma vida eterna através da arte.

A arte sempre foi um instrumento utilizado pelo homem para expressar seus sentimentos, desenhando, pintando, esculpindo. Com o passar dos séculos, o contexto de arte foi adaptando-se à cada cultura. Assim, cada grande artista colaborava na sua época com algo a mais nas suas obras.

Chegamos ao século XXI e nos deparamos com algo que chocou o mundo. Body Worlds, de Gunther Von Hagens, conhecido como o “escultor de cadáveres” ou o “Salvador Dali do corpo humano“. Von Hargens, anatomista alemão de 57 anos, tem como sua fonte de inspiração um personagem do célebre quadro “A Aula de Anatomia do Dr. Tulp”, do holandês Rembrandt. Atualmente, vive na cidade chinesa de Dalian, onde montou uma verdadeira indústria de conservação de cadáveres. Difundiu um método da “plastinação”, que se resume na imersão do espécime ou órgão dissecado em acetona para evacuar toda a água do corpo. “Leva-se a um banho de polímero de silicone (como silicone de borracha ou o poliéster), e é selado numa câmara em vácuo. A acetona sai do corpo em forma de gás e é substituída pelo polímero de silicone até ao nível celular mais profundo; O polímero de silicone endurece e assim o espécime é preservado de uma forma perfeita, como se tivesse vida já que consegue manter o relevo original e a identidade celular”, ensina Von Hargens.

O alemão considera-se continuador de uma tradição iniciada por ninguém menos que Leonardo da Vinci, gênio renascentista considerado o precursor da anatomia moderna, ele dissecou mais de 30 corpos em uma época em que a Igreja punia severamente a prática. O anatomista ficou rico e famoso com suas "obras de arte" feitas de cadáveres. Em entrevista ao nosso blog, o psicólogo e professor universitário, Carlos Roger Sales, falou que: “Ela nos inquieta como só arte que aproxima do humano pode fazer. Ele nos mostra uma maneira forte como é a vida e a finalização desta. Mas se você for ver de perto, ele coloca os corpos como se estivessem vivos. Deste modo, ele fala mais da vida que da morte.”

Milhares de pessoas visitaram a exposição Body Words no mundo todo. As opiniões são variadas: Médico ou açougueiro? Essa foi uma das avaliações feitas por pessoas que visitaram a exposição, de autoria do anatomista. É normal a adoração ao corpo morto? “Fazemos isso de certo modo quando velamos alguém. É uma adoração ao que foi e não é mais. Uma maneira de manter a memória. Imagens e símbolos religiosos têm uma função bem semelhante”, respondeu Roger. Será que o trabalho dele chega a beneficiar a medicina ou é só uma espécie de show bussiness? Uma pergunta de difícil resposta, pois a pouco tempo ele fez uma autópsia ao vivo para um canal de TV, onde dissecou o cadáver de um homem de 72 anos na frente de uma platéia de 350 pessoas que disputaram os valiosos ingressos . Assim que ele fez o primeiro corte com o bisturi, a platéia veio abaixo. Aquilo que Von Hagens faz, para uns é considerado arte, enquanto para outros é simplesmente um show de horrores, que explora o corpo humano da maneira mais vulgar. Com certeza, é melhor do que o “nosso jornalismo policial”, que gosta de exibir corpos baleados e esfaqueados. “Mas se o artista o fez de um modo respeitoso e explicativo, por que não?” Expõem Roger. Von Hargens afirma que seu trabalho tem cunho educativo, o público pode comparar os pulmões de um fumante e de um não-fumante e ver os estragos que o álcool causa ao fígado, por exemplo, e não fala abertamente que considera o seu trabalho obra de arte, mas percebe-se que ele tem pretensões nesse campo.
A polícia do mundo todo está investigando de onde vêm os corpos que o anatomista utiliza nas exposições. Em 2004, a Sociedade Internacional de Direitos Humanos chegou a exigir, o fim da exposição itinerante que tem recolhido em todo o mundo severas críticas e rasgados elogios, briga que foi em vão. Na concepção pós-moderna de arte, mostrando o belo ou o grotesco, há a intenção de chocar, e a exposição de Von Hagens realmente choca a todos. Claro, quem ainda tem dúvidas sobre o que pensar, não perca a oportunidade de visitar a exposição na próxima vez que ela estiver no Brasil.


3 comentários:

matina disse...

Na minha opinião, afinal o comentário é meu, a morte não tem nada a ver com a arte.

E a pseudo arte do Von Hargens me choca.

*Talita

LINHA MORTAL disse...

Rafaela,
também podemos considerar muitas reproduções artísticas de Jesus na cruz como formas de aprisionar o coração e a mente dos cristãos... através da culpa. Já encontrei depoimentos de Von Hagens em que ele demonstra claramente considerar-se artista... e a arte nem sempre procurou chocar, houve época em que ela era apenas uma reprodução da natureza, buscando deleitar o apreciador (de Estética, lembra?)

LINHA MORTAL disse...

Revisado.