quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Morte: medo ou atração?




Por Renata Teophilo


Curiosidade mórbida, o que vem a ser? É a mobilização que qualquer pessoa tem em direção à morte. Desde indefiníveis datas, as pessoas se amontoam para olhar a morte acontecendo. Historicamente, os povos romanos talvez sejam a primeira cultura a apreciar a morte de um ser humano lutando por sua própria vida em nome do entretenimento de seus monarcas e do povo, isto acontecia em um palco gigantesco construído especificamente para este tipo de apresentação que se chamava Coliseu. Suas ruínas continuam de pé testemunhando sua grandiosidade. No entanto, tal comportamento não cessou. Basta um olhar remoto através da história para verificar que as crucificações, execuções ou as grandes catástrofes sempre foram e continuam sendo alvo do olhar esbugalhado das massas.
Esse comportamento é tipicamente humano em qualquer cultura, e tal fenômeno não se reduz a uma simples apreciação. A curiosidade mórbida é antes uma expressão do medo do desconhecido, que apesar do choque, gera uma aproximação. Há quem defenda que o agente provocador deste comportamento seja a educação religiosa ou espiritual. Porém, outros afirmam que não é necessária qualquer influência, pois, sendo o único animal consciente da morte, tal curiosidade é natural ao homem.
Apesar destas afirmações vemos uma questão que ultrapassa a moral ou a naturalidade. Dada a quantidade de platéias que corriqueiramente lotam teatros e cinemas onde acontece a exibição de dramas que tratam da morte, esse tema tem sido alvo fácil da imprensa sensacionalista. Desde a década de 80, foram criados diversos programas televisivos que mostram, por vezes com crueza, cadáveres estendidos no chão. Hoje, quase toda cidade tem dois ou mais programas que exploram o tema em pleno meio-dia, por trás da bandeira de programa policial.

O estudante de psicologia Vicente Monteiro comenta que é fácil observar uma maior evidência deste fenômeno nas sociedades ocidentais (influenciadas pela cultura greco-romana), diz que há uma mobilização cotidiana mais patente em questionar a finitude, e isso se dá porque depois da Revolução Industrial e das duas grandes guerras, nós desritualizamos a morte, nos habituamos a questionar menos a morte e a valorizar em demasiado a vida que é vendida nos meios de comunicação dos mais poderosos. Ainda segundo ele, a curiosidade mórbida não provoca só o questionamento da morte, mas também uma estranha apreciação que para uns traz gozo e para outros, asco. “Lembro que, quando eu morava no subúrbio, sempre que alguém morria, o bairro em peso ficava aguardando a chegada do rabecão. Muitos ali brincavam e sorriam diante do corpo. O espetáculo da vida e da morte acontece ao mesmo tempo no mesmo palco”, complementou. Por fim, Vicente fez referência a duas músicas que trazem mensagens diferentes sobre o tema em alguns pontos da letra: “De frente pro crime”, de João Bosco e “Construção”, de Chico Buarque.